segunda-feira, 11 de janeiro de 2010
Carmem Costa e Paulo Marquez - A Música de Paulo Vanzolini (1974)
Logo na contracapa do disco, Paulo Vanzolini anuncia: "Fazer um samba é um tanto uma questão de paciência". Ouvir os sambas que o compositor paulistano criou desde os anos 50 talvez não exija tanto, mas não há dúvidas de que suas letras requerem certa atenção a mais. Vanzolini, hoje em dia com 85 anos, é antes de tudo um zoólogo (ou "zoológico", como considerou seu amigo Adoniran Barbosa em uma entrevista), cientista "letrado" e dono de canções que representam o cotidiano boêmio da São Paulo de sua época - e que ainda dizem muito da identidade da cidade. Porém, várias de suas composições se esqueceram do autor no boca-a-boca popular, como o samba Volta Por Cima, que às vezes parece até ter um caráter de hino ("levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima"). Mas o compositor pontuou, em entrevista a Ricardo Dias para o filme musical Um Homem de Moral, que para ele o mais importante na letra é o que diz o verso anterior ao jargão: "reconhece a queda e não desanima". Assim, Vanzolini desenvolve histórias a partir de recortes urbanos, e não deixa de fora anedotas engraçadas sobre sujeitos comuns.
Na interpretação dos veteranos Carmem Costa e Paulo Marquez, o tom antigo e nostálgico é reforçado, diferentemente do que acontece na coletânea Acerto de Contas (também com composições de Vanzolini), em que a leitura das músicas é moderna, ou na maioria das gravações das canções do compositor. Não é para menos, pois Carmem Costa entrou para o mundo musical graças a Francisco Alves, de quem era empregada, e começou a fazer sucesso nos anos 40. Enquanto isso, o mineiro Paulo Marquez estourava em uma rádio de Belo Horizonte. Em suma, ambos são cantores dos dias do rádio, e o disco agrega isso de maneira inegável.
Contudo, outra característica é a criatividade das letras, como já foi dito. A primeira é Mulher que não dá samba, na qual o eu-lírico reclama da paz que vive com a esposa ao invés da "roupa limpa e o café quente", e preferiria que a mulher fosse "ignorante no claro e ardente no escuro". Mas em Maria que ninguém queria, a personagem feminina é o oposto da esposa submissa, e encarna uma Maria que, após ser "reformada" pelo companheiro, o abandona e só propõe reconciliação se apenas 50% da moça lhe pertencer. E na décima primeira faixa, Mulher toma juízo, o narrador chega à conclusão de que "mulher que se vira pro outro lado/ tá convocando a suplente/ mulher que não ri não precisa dente".
É raro alguma letra de Vanzolini escapar de versos inteligentes e histórias divertidas. Nesse disco, felizmente, além das letras há boas interpretações de grandes cantores menos lembrados do que deveriam, mas que - como o próprio compositor escreveu - produziram um trabalho cujo "autor sai de cena, e fica apenas torcendo para seu público gostar".
Faixas:
1. Mulher que não dá samba
2. Falta de mim
3. Inveja
4. Ronda
5. Samba Abstrato
6. Sorrisos
7. Teima quem quer
8 Maria que ninguém queria
9. Menina o que foi o baque
10. Cara limpa
11. Mulher toma juízo
12. Choro das mulatas
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2 comentários:
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Vanzolini é ouro! conheço-o pessoalmente, era colega de escola dos meus avós.
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